sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012


ANDAR A CAVALO X CAVALGAR
 
     Cavalgar ou montar é uma coisa, equitar é outra bem diferente. Monta-se em touros, terneiros, camelos, elefantes e até nos adversários. Conseguir equilibrar-se no lombo de um cavalo não é equitar, pois isso até o macaco, sem ser, por isso, cavaleiro. Já equitar implica num interrelacionamento com o cavalo, numa ligação neuro-sensorial entre homem e animal tão bem representada pelo centauro e que só se aprende com sabedoria e tempo. Relacionamento liderado pelo homem.
      É raro encontrar um homem que confesse não saber equitar. (Por não ser obrigada, pela nossa cultura, de aparentar valentia, a mulher já é mais sincera). Como já montaram, pelo menos quando eram crianças, na casa do avô, numa fazenda, na chácara de um amigo, julgam-se cavaleiros. A maioria deles, somente de em pêlo, o que, para nós, demonstra certa ignorância na arte de equitar, já que equitar, além se interrelacionar com o cavalo, é equilibrar-se em estribos [1]. Muitos desses pseudo-entendidos desconhecem até o lado de montar. (Mesmo que muitos cavalos aceitem serem abordados por qualquer lado, o lado correto de montar é o esquerdo do animal. Isso porque a grande maioria das pessoas é destra: quando monta, o primeiro pé que entra no estribo é o esquerdo. Entretanto, Omar Picún descobriu que na Idade Média os cavaleiros montavam pelo lado direito, "cuando la espada de los caballeros impedía hacerlo por el otro lado").
      Parece que confessar não saber andar a cavalo é uma fraqueza, resquício do machismo que imperou por milhares de anos ao correlacionar o cavalo com hombridade e poder. Hoje, o cavalo foi substituído pelo carro, mas com a mesma conotação de domínio, própria do Mito do Herói, tão destrutivo que ordena conquistar, dominar, vencer, chegar primeiro, nem que seja passando por cima do cadáver do adversário.
      Na verdade não existe, nesse mundo velho e sem porteiras, nenhuma pessoa saudável que não possa andar a cavalo - ser transportada no lombo de um cavalo. Já equitar é outra coisa... Para equitar é preciso, primeiro, gosto - o segredo de fazer bem feita qualquer coisa; depois, talento e, por fim, treino. Não resta dúvida que as pessoas nascem com certos talentos que torna fá-ceis tarefas que para outros são difíceis. A gente descobre que gosta de cavalgar quando sonha com galopes. Sonhar com galopes é conhecer a beleza real, palpável e possível, já que o galope é a perfeição do andar. Só os poetas, que não sabem cavalgar, sonham voar como garças brancas, como pegasus alados. Aos poetas não importa se cavalos não voam, porque dispensam a realidade desde que exista a poesia.
      Equitar é ligar o próprio sistema nervoso ao corpo do animal, como se ele fosse extensão do próprio corpo. É comunicar-se com ele através de rédeas, bridões, buçais, cabrestos, mas também com as pernas, com a postura (posição do corpo) e com o tom de voz. Para isso é indispensável entender sua linguagem, que ele manifesta através da expressão corporal.
     
     
     1 Esta idéia não é compartilhada por grande parte dos adestradores de cavalos que consideram o andar "em pêlo", sem arreios nem estribos, o supra-sumo da arte eqüestre. Para o autor, andar "em pêlo" é apenas um passo no rumo da sincroni-zação neuro-sensorial entre o cavalo e o homem.
     

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